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Cai interesse dos brasileiros por apps de relacionamento

Há oito anos, um aplicativo passou a fazer parte da rotina do professor de educação física Diego Moraes, 32. Havia pouco tempo que tinha terminado um relacionamento, queria conhecer pessoas, ter encontros casuais e, quem sabe, achar uma nova parceira. Ele morava em Bauru (SP), cidade com diversos polos universitários, e onde o Tinder estava presente nos celulares de muitas solteiras. Mas de 2016 para cá, a percepção dele é de que os aplicativos de relacionamento não são mais tão interessantes quanto antes. Não por acaso, o número de usuários ativos tem caído e especialistas falam de um “cansaço” na busca online por um novo amor.

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É sob esse cenário que dados do Sensor Tower, consultoria especializada em aplicativos de celular, mostram a queda nos números operacionais do Tinder no Brasil. A quantidade de usuários ativos caiu 24%, saindo de 5,4 milhões no primeiro trimestre de 2022 para 4,1 milhões no terceiro trimestre deste ano. Nessa toada, os downloads semanais recuaram 23%, passando de 140 mil para 107 mil no mesmo período.

Ao InfoMoney, Moraes conta que não excluiu os apps, mas reduziu o uso. Inclusive, a experiência dele não se restringe ao interior paulista: usou o Tinder e o Bumble no exterior. Nesse meio tempo, ele morou na Irlanda, Espanha, Itália e Portugal, além de visitar outros países do velho continente.

Segundo Moraes, diferente daqui, as europeias estavam mais abertas a terem encontros descompromissados, visando somente amizades. “Aqui tem a questão da insegurança, é compreensível que as brasileiras sejam mais receosas para saírem num date. Fora que a sociedade é mais conservadora”, diz.

Mesmo assim, tanto no exterior quanto por aqui, a experiência dele no aplicativo se tornou cansativa. “Por haver tantas opções disponíveis, as mensagens são menos respondidas. E quando há um encontro, se a expectativa do outro não for atendida, já era, não vai ter outro date ou mais conversas. Tenho preferido não passar por essas emoções”, detalha.

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A experiência narrada vai em linha com as observações de Carmita Abdo, psiquiatra e professora da Faculdade de Medicina da USP e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. “As dinâmicas dos aplicativos levam a encontros que, muitas vezes, não representam nada diante da expectativa do usuário”, explica. Segundo ela, isso pode ser tanto em relação ao que foi projetado sobre o outro quanto a si próprio.

“O indivíduo pode estar com a autoconfiança abalada, por se sentir inexperiente ou menos atraente. A ‘parceria’ pode também não atrair ou o outro não ‘se desempenhar bem’.”

— Carmita Abdo, psiquiatra e professora da USP

A uberização do amor

Quem também compartilhou um certo cansaço pelos aplicativos de relacionamento foi Samuel*, de 25 anos. O designer se mudou para a cidade de São Paulo há cinco anos, ao iniciar a faculdade em 2019, e logo passou a ser um usuário ativo dos apps. A intenção dele era encontrar um amor. “Até hoje não aconteceu”, conta. Ele usa o Tinder e o Grindr, aplicativo voltado para a comunidade LGBT+. “É isso o que consigo: alguns encontros casuais e únicos”, afirma. Ao contrário de Moraes, para Samuel a experiência não mudou, sempre foi essa, tanto com homens quanto com mulheres.

Inclusive, essa pode ser uma sensação comum entre os mais jovens. Carmita frisa que as novas gerações demoram mais para iniciarem um contato físico. Além disso, ela aponta que o relacionamento virtual se tornou um hábito. “Muitas vezes elas não se sentem habilitadas para o encontro, pois, quando tentam o contato presencial, não sentem o mesmo prazer [comparado ao virtual], e não encontram a mesma forma de realização, porque não há um controle sob a sua mão. Então surge o pensamento: por que usar um aplicativo que vai me levar a um encontro que será frustrante?”

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Leia também: Milei recorre ao Tinder para marcar encontro com Big Techs

Enquanto isso, a professora de Antropologia na Universidade Estadual Paulista (Unesp), Larissa Pelúcio, fala sobre a “uberização” do amor em tempos de aplicativos de namoro em um artigo acadêmico. Segundo ela, atualmente as relações exigem competências emocionais múltiplas e disponibilidade para se lançar no mercado dos afetos como “empreendedores”.

“Esteja disponível para novas aventuras (ou para novos matches e crushes); não hesite e não pare; não se prenda a pactos e não nomeie as relações, isso limita a sua experiência; seja livre, mesmo que isso doa um pouco”, exemplifica Larissa Pelúcio ao falar da lógica vigente na “uberização” do amor.

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A pesquisadora afirma ainda que, sem regulações claras, as pessoas estão explorando um novo regime de gestão dos sentimentos, que também é algorítmica — visto que o aplicativo busca conectar as pessoas com “pares ideais”, considerando escolhas feitas previamente, “pistas” deixadas em outras redes sociais entre outros dados.

“Perfis menos ‘competitivos’ recebem menos likes. São, portanto, menos demandados, e ainda assim tendem a ser aqueles que ao serem acionados aceitarão a ‘corrida’ para qualquer destino”

— Larissa Pelúcio, professora de antropologia da Unesp

Vale pagar por serviços em apps de relacionamento?

Mas mesmo que os usuários do Tinder, Bumble, Grindr e afins estejam passando por uma exaustão diante desse “empreendedorismo romântico”, isso não significa que as expectativas sejam do fim da era dos relacionamentos por tela.

Dados da Statista mostram que 16,7 milhões de pessoas usaram serviços de namoro online no Brasil no ano passado e, para 2028, a expectativa é de que o número chegue a 18 milhões. No entanto, o número de pagantes, que obtêm recursos premium dessas plataformas, deve ficar estacionado em aproximadamente 3 milhões.

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Samuel revela que já cogitou fazer a assinatura do Grindr, mas não era para chamar a atenção de outros usuários e ter mais encontros. “Estava planejando uma viagem ao Ceará sozinho, no ano passado, e pensei em assinar o app para, antes, fazer amizades com a comunidade local e saber quais lugares frequentar. Isso ajudaria a me sentir mais seguro”, conta. Só que a viagem não aconteceu e o designer não se tornou assinante, ainda assim, ele cogita usar a ferramenta quando o plano sair do papel.

Diego Moraes, 32, hoje usa aplicativos como Tinder para fazer novas amizades ao viajar para diferentes países. (Foto: Arquivo pessoal)

Já Diego Moraes, com a mesma finalidade, se tornou assinante do Tinder em momentos pontuais, antes de viajar para lugares onde não conhecia ninguém — no Brasil e pela Europa. “Não só amizades, a ideia era conversar com as pessoas locais para descobrir o que tinha para fazer na cidade e não ter aquela experiência ‘engessada’ de turista. Costuma dar certo e ainda faço amizades que levo comigo.”

Namoro na Bolsa de Valores

Enquanto as pessoas vão adaptando o coração ao que os aplicativos oferecem, as empresas que oferecem esses serviços vivem uma verdadeira montanha-russa em meio às mudanças.

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A Match Group (M1TC34), dona do Tinder, Hinge, OkCupid e Match.com, fez abertura de capital (IPO) em 2016, capitalizando US$ 460 milhões. A companhia viu o valor de mercado disparar na pandemia, passando de US$ 40 bilhões no final de 2020, com as ações negociadas a US$ 150 em Nova York.

Hoje, a empresa é avaliada em US$ 9,1 bilhões e seus papéis estão na casa dos US$ 36.

Na mesma maré, o Bumble (B2MB34) também se desvalorizou. Desde o IPO em 2021, a capitalização passou de US$ 8,6 bilhões para os atuais US$ 1,2 bilhão, enquanto as ações saíram de US$ 86 para US$ 7.

Mesmo que os aplicativos de relacionamento parecem estar se distanciando do auge, os analistas do mercado financeiro ainda veem oportunidades — pelo menos com a dona do Tinder, que vai divulgar o seu balanço financeiro do terceiro trimestre de 2024 na próxima semana.

Após apresentar um crescimento anual de 4% em suas receitas no trimestre passado, além de propor melhorias de experiência aos usuários e anunciar cortes no quadro de funcionários, o Match Group teve a recomendação de compra reiterada pelo Goldman Sachs e Bank Of America (BofA).

O Bumble, por outro lado, foi rebaixado por alguns bancos e corretoras como abaixo do desempenho (underperform) depois de reduzir sua previsão de crescimento anual de receita para entre 1% e 2%, ante projeção anterior de 8% a 11%.

* Nome trocado a pedido do entrevistado, que preferiu não se identificar

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